Indústria e Tecnologia
CAPACITAR I4.0 – QUALIFICAR PARA O DIGITAL
Com o presente artigo propõe-se a análise dos desafios que se enfrentam com a 4.ª revolução industrial, como as mudanças estão a ocorrer no mercado de trabalho e as respostas disponíveis para apoiar as pessoas e as organizações a atenderem a estes desafios. O programa Capacitar i4.0, lançado de dezembro de 2017 – que integra as iniciativas nacionais indústria 4.0 e INCoDe.2030 – é uma das fontes de ignição, estando estruturado em oito linhas de ação.
O que encontra neste artigo?
Compreender que as mudanças estão a ocorrer a uma velocidade exponencial e que se estão a criar novos paradigmas na economia, nas empresas, na sociedade e nas pessoas, com um impacto sistémico que envolve a transformação de sistemas inteiros, é fundamental para aproveitar as oportunidades desta mudança e criar valor,
A 4.ª REVOLUÇÃO INDUSTRIAL
A Revolução Industrial marca a mudança no setor, com o desenvolvimento de vários avanços e transformações, principalmente tecnológicos, que permitiram agilizar procedimentos, bem como acelerar e ampliar o processo produtivo.
Atualmente, muito se fala da Indústria 4.0, dos seus avanços e na forma como esta se está a desenvolver, bem como do receio face à eventual substituição do homem pela máquina, no desempenho das suas funções.
Contudo, estes desenvolvimentos não são exclusivos da atual conjuntura, despoletada pela adoção dos pressupostos de automação da indústria 4.0, sendo necessário entender que não representam senão o culminar diversos catalisadores, que remontam ao século XVIII, com advento da 1ª revolução industrial.
A 1ª revolução industrial dá-se em Inglaterra, no séc. XVIII, com a máquina a vapor e a mecanização dos processos de produção [1], [3].
No início do séc. XX, com a introdução da energia elétrica e dos combustíveis fósseis, ocorre a 2ª revolução com a criação de linhas de produção em série[1].
A 3ª revolução acontece na década de 70 com a automação dos processos e a introdução da eletrónica e dos computadores que permitiam programar os robots. Foi o início da “era da informação” [1], [3].
Em 2011, na Alemanha, é introduzido o termo “indústria 4.0” e desde então têm nascido vários programas. França em 2013 lançou o “Nouvelle France Industrielle”, em 2014 a Finlândia o “Industrial Internet Business Production” e em 2015, Espanha, o programa “Industria Conectada 4.0” [1].
A 21 de Abril de 2016, o governo português lança a Iniciativa “Indústria 4.0” através de quatro grupos de trabalho (Moda & Retalho, Automóvel, Turismo e Agroalimentar) que tinham como o objetivo identificar tendências, necessidades e iniciativas concretas que potenciem a adoção 4.0 em Portugal [2].
Em abril de 2019, lança a Fase II desta iniciativa, com três eixos estratégicos (GENERALIZAR, CAPACITAR E ASSIMILAR) com o propósito de mobilizar investimentos na ordem de 600 milhões de euros, 20 mil empresas, capacitar mais de 200 mil trabalhadores e financiar cerca de 350 projetos [2].
Estas fontes de ignição são importantes para promover, em Portugal, a “transformação digital”. Porém, este processo é, apenas, possível se as organizações fizerem o exercício de analisarem o seu estado de maturidade e daí definirem uma estratégia de inovação que assegure o aumento do nível de conhecimento das pessoas, a sua capacidade produtiva, eficiência e eficácia.
A 4.ª revolução industrial, também designada de “transformação digital” é, então, caracterizada pela introdução de sistemas ciberfísicos – inteligentes e interligados – nos processos de produção; na cadeia de valor; na relação com o cliente e no modelo de negócio. O seu âmbito é vasto e não se refere apenas a máquinas e sistemas inteligentes e conectados: vai desde o sequenciamento genético à nanotecnologia, passando pelas energias renováveis e pela computação quântica. É a fusão destas tecnologias e a interação entre os domínios físico, digital e biológico que torna esta 4.ª revolução diferente das revoluções anteriores [3].
Este novo paradigma é dominado por conceitos como:
Esta transformação digital – aliada à tendência de produções à medida, just-in-time, com “zero stocks” e um mínimo de tarefas de valor não acrescentado – impõe às empresas e às pessoas que sejam capazes de:
– Definir uma estratégia de digitalização coerente que envolva, desde muito cedo, as pessoas no processo de mudança e que conduza a uma solução integrada de gestão da informação e do conhecimento que, certamente, combina vários softwares comerciais ou desenvolvidos à medida e sistemas ciberfísicos (máquinas e equipamentos);
– Ter a noção dos custos fixos e anuais que decorrem da implementação desta estratégia, bem como, da equipa necessária para a gerir;
– Identificar os requisitos da infraestrutura tecnológica a adotar;
– Definir uma arquitetura de processos e sistemas que preconize a digitalização das operações-chave da cadeia de valor e permita avaliar, em tempo real, os principais indicadores de desempenho da empresa – preconizando maior eficiência, agilidade, qualidade e capacidade de alerta a desvios;
– Implantar – com recurso à automação e à IoT (Internet of Things) – um modelo de “Smart Factory”, que assegure um fluxo contínuo de informação, através da integração entre sistemas, máquinas, equipamentos e pessoas;
– Promover a programação de lógicas implícitas de negócio que estão apenas “na cabeça das pessoas” em algoritmos que tornem explícito esse conhecimento;
– Ter acesso a quadros qualificados e capacidade de os formar.
A 4.ª Revolução Industrial implica, assim, uma mudança de atitude e a clara perceção de que vivemos num mundo global – interligado e radicalmente aberto – onde a única certeza é a incerteza e a fonte adquirida de vantagem competitiva é o conhecimento, estando a informação e as tecnologias acessíveis a todos.
O PROGRAMA CAPACITAR I4.0
Em 2017, o governo Português lança a “Iniciativa Nacional para as Competências Digitais e.2030, Portugal INCoDe.2030”, que pretende ser um programa integrado de política pública para a promoção/desenvolvimento das competências digitais.
Esta iniciativa desenvolve-se em cinco eixos (1. Inclusão; 2. Educação; 3. Qualificação; 4. Especialização e 5. Investigação), que abrangem desde: a literacia digital; à educação das novas gerações; à qualificação da população ativa; até à especialização de pessoas licenciadas para ocuparem empregos digitais avançados e à investigação.
No âmbito das atividades do Eixo 3: Qualificação foi apresentado, a 6 de dezembro de 2017, no 1.º Fórum Permanente do INCoDe.2030, o programa Capacitar i4.0, que se desenvolve em oito linhas de ação, nomeadamente:
Neste contexto, várias iniciativas têm sido despoletadas para promover a capacitação para as competências digitais.
No dia 18 de junho de 2019, é lançado o editar do selo “uma ação INCoDe.2030” que visa reconhecer, distinguir e conferir notoriedade às ações de informação e formação que se candidatem e assinalar a ampla mobilização da sociedade em torno dos objetivos e metas do INCoDe.2030, [4].
Como resultado de um protocolo de colaboração entre o ISQ; o IAPMEI; a Universidade de Aveiro; a Universidade do Minho; o Instituto Politécnico de Leiria e o INCoDe.2030, surge o Programa SHIFTto4.0. Um programa de diagnóstico do estado de maturidade das empresas portuguesas face aos desafios da Indústria 4.0.
A implementação piloto do Diagnóstico Shifto4.0 decorreu de janeiro a setembro de 2019, tendo sido validadas 103 respostas neste questionário.
Deste trabalho resulta um conjunto de oportunidades, boas práticas, ferramentas e medidas que visam apoiar os processos de reflexão estratégica das empresas no seu percurso de transformação digital e reforço de competências nesta área.
Iniciativas como Centros de Interface Tecnológico, Laboratórios Colaborativos (CoLabs), Open Days i4.0, Programa Formação-Ação da “Academia de PME”, Digital Innovation Hubs, Colabs, Rede Nacional de Incubadoras e de Fablabs e muitas outras, são também excelentes exemplos.
Vários são, também, os sistemas de incentivo disponíveis para a (re)qualificação de ativos ou que majoram o desenvolvimento de projetos que promovam a adoção dos princípios de indústria 4.0.
Acredito que temos, hoje, em Portugal, alavancas que estimulam a empregabilidade e a formação em tecnologias e aplicações digitais e que as nossas empresas estão conscientes dos desafios e dos investimentos a realizar para a criação de valor sustentável.
Referências bibliográficas:
[1] B. Sniderman, M. Mahto, M. J. Cottelleer (2016). Industry 4.0 and manufacturing ecosystems – Exploring the world of connected, Deloitte University Press, 2016;
[2] KPMG Portugal (2019). Indústria 4.0 – Fase II. República Portuguesa, COTEC e IAPMEI;
[3] K.(2017). A Quarta Revolução Industrial, World Economic Forum, Levoir;
[4] INCoDe.2030, “Edital do Selo INCoDe.2030, FTC, 18 de junho de 2019.
Cristina Barros
Sócia fundadora e gerente da SINMETRO e desde 1998 que trabalha com a indústria no desenvolvimento de sistemas de informação, consultoria e formação nos setores alimentar, farmacêutica, automóvel, moldes & plásticos, eletrónica, aeronáutica, mobilidade, química, têxtil, de software, e-commerce, entre outras. É Licenciada em Engª Química, Mestre e Especialista em Engenharia e Gestão Industrial e Professora Adjunta e Especialista do Politécnico de Leiria desde 2000.