Artigo, Pré-embalados

Legislação nos Pré-embalados: Portugal vs Espanha

É frequente os embaladores e importadores portugueses questionarem porque é que os nossos vizinhos espanhóis não são sujeitos às verificações metrológicas como acontece em Portugal. Apesar da legislação nos pré-embalados em Portugal e Espanha ser muito semelhante, a sua implementação não acontece da mesma forma. É precisamente sobre este assunto que vamos falar neste artigo!

A Recomendação R87 da OIML (Organização Internacional de Metrologia Legal) é o documento de referência internacional que estabelece as condições em que os produtos pré-embalados devem ser comercializados. Este documento define as “3 Regras do Embalador” e como devem ser realizados os ensaios para validação dos lotes de pré-embalados pelas Entidades Competentes.

Na Europa, esta recomendação foi transposta para as Diretivas Comunitárias atualmente em vigor, a Diretiva 76/211/CEE e a Diretiva 2007/45/CE. Estas Diretivas, por sua vez, foram transpostas para o Direito Nacional dos vários Estados Membros. No entanto, as responsabilidades atribuídas às Entidades Competentes podem variar entre os vários Estados Membros.

Legislação nos pré-embalados: como se aplica nos dois países?

Legislação nos pré-embalados em Portugal

Em Portugal, aplicam-se os pressupostos das Diretivas Comunitárias referidas acima através de dois diplomas legais distintos. O Decreto-Lei n.º 199/2008 de 8 de outubro e a Portaria n.º 1198/91 de 18 de dezembro.

O primeiro define as condições que os pré-embalados devem obedecer na sua comercialização, nomeadamente as “3 Regras do Embalador”, a colocação da marca de conformidade “e” e outros requisitos de rotulagem, bem como as quantidades nominais obrigatórias aplicáveis apenas aos vinhos e bebidas espirituosas. Constitui o documento de suporte, no qual os embaladores se devem sustentar para saber o que precisam de cumprir para poderem colocar pré-embalados no mercado.

O segundo estabelece as condições em que se devem realizar os ensaios de verificação metrológica para validação dos lotes de pré-embalados, bem como os critérios para a aceitação dos mesmos. Apenas as entidades qualificadas para o efeito devem utilizar este diploma legal. No caso português, afiguram-se como OVM (Organismos de Verificação Metrológica).

Legislação nos pré-embalados em Espanha

Na legislação nos pré-embalados em Espanha, o diploma legal que transpõe para o direito nacional os pressupostos das Diretivas aqui referidas é o Real Decreto 1801/2008 de 3 de novembro. Neste decreto, estão estabelecidas não só as condições para comercialização dos pré-embalados, como também os critérios e os planos de amostragem estabelecidos para a aceitação dos lotes.

Da análise do documento, depreende-se que é o embalador o responsável por implementar os ensaios e a metodologia descrita no mesmo. É o embalador que, ao implementar os planos de amostragem previstos no Real Decreto, e aplicando os critérios de aceitação aí estabelecidos, valida as “3 Regras do Embalador”.

Cabe às Entidades Competentes validar se o controlo implementado pelo embalador se encontra em conformidade com o estabelecido na legislação de pré-embalados. Ou se qualquer que seja a metodologia implementada, esta possui uma eficácia comparável.

No Artigo 15 do referido decreto, estão estabelecidas estas condições. E também a metodologia a aplicar para validar outros métodos comparáveis. O mesmo artigo refere ainda que não está excluída a possibilidade das Entidades Competentes poderem realizar ensaios para validar os critérios de aceitação estabelecidos, em qualquer fase da cadeia de distribuição.

Por regra, em Espanha, não são as Entidades Competentes que implementam os ensaios para validação dos critérios de aceitação do lote, mas sim o próprio embalador. Posteriormente, será sujeito ao escrutínio dos serviços de metrologia, de forma a garantir que os mesmos cumprem com os requisitos aplicáveis, ao contrário do que acontece em Portugal.

Legislação nos pré-embalados

Comparação dos métodos: Portugal vs. Espanha

Importa compreender que ambas as metodologias aplicadas pressupõem a implementação dos princípios estabelecidos pela Recomendação R87 da OIML. E que essa possibilidade está prevista pelos organismos europeus que regulam a implementação destes documentos de suporte, nomeadamente o WELMEC.

Tendo como base esse pressuposto, deixo aqui apenas alguns comentários relativos a estas diferenças que procuram, sobretudo, encontrar pontos de ligação entre as diferentes metodologias. Para que seja possível existir cooperação, sem que necessariamente algumas das opções seja preferível em relação à outra.

Principais diferenças nas metodologias aplicadas:

Em Portugal, a diferenciação em dois diplomas legais coloca o ónus da responsabilidade da implementação dos ensaios nos OVM. O que me parece bastante adequado do ponto de vista da imparcialidade e da idoneidade. Supostamente, esta avaliação será mais isenta quando realizada por uma entidade alheia ao embalamento do que quando realizada pelo próprio embalador, como acontece em Espanha.

Por outro lado, a existência de um diploma legal exclusivo para os embaladores (Decreto-Lei n.º 199/2008 de 8 de outubro), que estabelece apenas as “3 Regras do Embalador”, mas deixa em aberto os planos de amostragem que o embalador deve utilizar, poderá gerar algum desconforto aos embaladores. Pode inclusive levar a alguma dificuldade na implementação do controlo em processo, por ser necessário a aquisição prévia de conhecimentos de controlo estatístico do processo.

Os embaladores espanhóis têm esta etapa simplificada, pois podem utilizar os planos de amostragem indicados no Real Decreto. Em Portugal, estão apenas reservados aos OVM, pela implementação da Portaria n.º 1198/91 de 18 de dezembro.

Quais as implicações destas diferenças?

Em Portugal, e por orientação do Instituto Português da Qualidade (IPQ), compete aos OVM verificar a correta implementação das “3 Regras do Embalador”.

Embora os modelos de avaliação do controlo em processo dos embaladores estejam bem explicados nos Guias do WELMEC, a regulação da atuação dos OVM neste domínio não acontece de forma incisiva e eficaz. Na verdade, as implicações podem levar a um fraco desempenho do embalador no seu controlo em processo. Por se dar mais enfase aos ensaios, que embora realizados de forma idónea e imparcial, realizam-se apenas um vez por ano. Não são, de todo, representativos das produções levadas a cabo pelos embaladores.

A Recomendação R87 da OIML refere, no seu âmbito, que os planos de amostragem aí estabelecidos não devem ser utilizados pelo embalador no controlo em processo dos seus pré-embalados.

Em Portugal, a legislação nos pré-embalados publicada segue à risca esta indicação, mas parte do pressuposto teórico de que, no que diz respeito ao controlo em processo, o embalador é capaz de realizar um controlo adequado aos seus pré-embalados. E de que os OVM conseguem facilmente validar estas metodologias, mas a realidade é bem diferente desta suposição.

Em Espanha é espectável que os embaladores estejam mais descansados e seguros na hora de procurar um método para validar os seus pré-embalados. Também as Entidades Competentes estarão mais confiantes na hora de validar a metodologia implementada pelo embalador, mas na verdade, os métodos de controlo em processo poderão não ser os mais adequados para garantir os requisitos aplicáveis, podendo igualmente levar a falhas na validação das embalagens.

Conclusão: Qual o método mais vantajoso?

Em geral, parece que ambas as metodologias têm as suas falhas e talvez seja difícil prever qual delas será a mais eficaz, mas o importante a reter é que, no que diz respeito a estes dois países e, certamente acontecerá com a maioria dos Estados Membros, ambos procuram cumprir o estipulado nas “3 Regras do Embalador”. Como tal, os pré-embalados aqui produzidos devem seguir precisamente os mesmos critérios de aceitação.

Quando questionado porque é que se a legislação nos pré-embalados em Portugal e em Espanha são as mesmas, os países têm metodologias de implementação diferentes, eu diria que na prática isso poderá ser irrelevante. Se considerarmos que o importante é cumprir precisamente os mesmos critérios de aceitação dos lotes.

Se depois verificarmos que o cumprimento desses mesmos critérios é mais ou menos falível num dos países, é porque ainda há um longo caminho a percorrer para a implementação eficaz destas regras. Não só em Portugal e em Espanha, mas em muitos outros países, inclusive, fora do espaço europeu.

Não quero com isto desvalorizar “as dores cabeça” que as diferenças da legislação nos pré-embalados trazem aos embaladores na hora de transacionar produtos além-fronteiras. A ideia deste artigo é precisamente demonstrar que as dificuldades existentes são inerentes à natureza do controlo deste tipo de bens. No fundo, os princípios de salvaguarda dos interesses dos consumidores são iguais em todo o mundo e é nesses que devemos focar a nossa atenção.

Autor Rui Silva

Mestre em Eng.ª do Ambiente, Rui Manuel Pedrosa da Silva realiza e coordena, desde 2008, ensaios de verificação metrológica de Pré-embalados. Desde 2012, participa como formador e orador em vários seminários e formações sobre Controlo Metrológico de Pré-embalados. Atualmente desempenha funções de Gestor da Qualidade e Diretor Técnico na empresa Aferymed.

Conheça o significado dessas alterações para os profissionais da indústria dos pré-embalados, neste webinar ACCEPT.

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